Tandara entra em quadra, nesta terça-feira (24), para jogar as quartas de final da Superliga contra o Minas grávida de 15 semanas (quase 4 meses). O(A) primogênito(a) da oposta do Praia Clube, porém, não é o(a) primeiro(a) filho(a) do vôlei a entrar em quadra com a mãe.
Há dez anos, a ponteira Paula Pequeno atuou com a filha Mel no ventre até cinco meses de gravidez. Nos anos 1980, a ex-jogadora Isabel exibiu o barrigão com Maria Clara até os seis meses de gestação.
Isabel voltou a treinar menos de um mês após o parto. Paula estava na seleção quatro meses depois –foi campeã olímpica em Pequim-2008 e Londres-2012.
Tandara espera o filho –ou filha– para setembro. Também espera conquistar seu segundo ouro olímpico no Rio, Jogos que vão nascer daqui a 500 dias.
Para explicar melhor a situação de Tandara ou qualquer outra atleta de alto-rendimento que queira competir grávida, o blog Olímpicos consultou a ginecologista Tathiana Parmigiano. Ex-atleta, mãe de Pedro (de dois meses), a médica que já trabalhou com as seleções brasileiras de basquete, judô e com o Comitê Olímpico do Brasil (COB), é considerada pioneira no país na aplicação da ginecologia no esporte.
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Olímpicos – É comum uma atleta continuar competindo mesmo grávida?
Tathiana Parmigiano – Atletas ou mulheres fisicamente ativas costumam apresentar uma rotina mais regular de exercícios durante a gestação do que as previamente sedentárias. Dependendo de sua condição obstétrica podem ser incentivadas e orientadas a manter o mesmo tipo de atividade a qual estejam acostumadas. Devem, entretanto, ser orientadas quanto a algumas adaptações relacionadas à intensidade do exercício, à importância de uma alimentação e hidratação adequadas a essa fase e de um ambiente arejado e propício à prática esportiva segura.
Há um limite de semanas de gravidez para a atleta continuar competindo sem problemas para ela ou para o bebê?
Não há na literatura uma idade gestacional determinada para que as atividades sejam interrompidas. Isso dependerá da evolução da gestação, eventuais sintomas referidos pela gestante e da evolução do bem estar materno e fetal. Atividades de impacto e/ou com risco de queda devem ser, evitadas, assim como as atividades competitivas ou com objetivos específicos de alcance de performance (melhora de marcas pessoais, por exemplo). Devido às alterações anatômicas e fisiológicas inerentes à gestação, atividades com esse fim não deveriam ser incentivadas neste momento da vida da mulher.
Quais tipos de cuidado uma jogadora de vôlei, como a Tandara, com 15 semanas de gravidez, precisa tomar para continuar jogando em alto nível?
A Tandara tem a seu favor o fato do vôlei fazer parte de suas atividades habituais. Seu corpo e condição física estão adaptados a esse esporte e isso a permite manter essa prática, ainda que, com certas restrições. A partir de 8 semanas as dimensões do útero gravídico ultrapassam os limites ósseos da pelve, que até então o protegiam, estando sujeitos a traumas seja pelo contato com outras companheiras ou com o solo. Apesar do vôlei não ser um esporte com grande contato como futebol ou handebol, o choque entre as atletas e o risco de queda são inerentes ao jogo, principalmente na sua prática competitiva. É importante que a atleta esteja atenta a eventuais sintomas como dor ou sangramento, devendo interromper a prática competitiva caso isso aconteça. A movimentação fetal ainda não é um parâmetro de avaliação por ainda não ser perceptível a mãe, estando o bem estar fetal restrito às avaliações ultrassonográficas. Assim, eventuais alterações podem passar desapercebidas. O caso da Tandara se assemelha ao de outra importante atleta da história do nosso vôlei, a Isabel. Sua atitude, entretanto, deve ser vista novamente como uma opção pessoal, não podendo servir de regra ao restante da população.
A atleta pode manter o peso durante a gravidez sem afetar o desenvolvimento do bebê?
O peso que uma gestante poderá ganhar durante a gravidez está diretamente ligado a sua condição corpórea pré-gestacional. Sendo assim, algumas podem ganhar mais e outras menos, assim como algumas são orientadas a não ganhar peso algum. É importante que a oferta alimentar esteja condizente com o gasto calórico da mulher em cada trimestre. Se isso acontecer, o feto irá absorver o que for necessário para seu desenvolvimento adequado, sem, necessariamente, isso implicar em ganho de peso materno. Vale ressaltar, entretanto, que o ganho de peso é apenas uma das variáveis a serem consideradas. A gestante tem sua biomecânica alterada com o aumento do volume uterino e consequente mudança de seu centro de gravidade, apresentará uma lordose fisiológica e maior frouxidão ligamentar. No caso de atletas isso pode aumentar ainda mais o risco de queda e de entorses.
É possível a atleta sair da gravidez, após o parto, e voltar ao alto rendimento quantas semanas ou meses depois?
O tipo de parto determinará, inicialmente, seu retorno ao esporte. O parto normal exige um período de recuperação menor que o da cesárea, que por ser uma cirurgia maior, implica em um período maior de afastamento. Além disso, para aquelas que optarem pelo aleitamento materno, deve-se atentar que exercícios devam ser realizados, preferencialmente, após as mamadas, com as mamas flácidas e com o uso de roupas adequadas. Vale ressaltar, ainda, que a alta intensidade do exercício, com a produção de ácido lático, pode alterar o sabor do leite. Isso poderia diminuir a ingesta pelo bebê e, devido a menor sucção, diminuir a produção do leite (não alterado se o exercício for realizado com intensidade moderada). Passado esse período inicial, o retorno deverá seguir as orientações do preparador físico, atentos às questões ortopédicas, sendo feito de maneira gradual com a intenção de se evitar possíveis lesões mas já direcionado ao retorno ao alto rendimento.