Teliana Pereira, 26, ganhou seu primeiro título de WTA neste domingo, em Bogotá. Em 2010, o pai da tenista número um do Brasil contou, em depoimento à Folha (leia abaixo), a história da família que deixou Pernambuco rumo ao Paraná e encontrou no tênis o futuro dos Pereira. Hoje ela é campeã e José Pereira da Silva é empresário no ramo de construção de quadras. Game, set, match!
MINHA HISTÓRIA: JOSÉ PEREIRA DA SILVA (24.ago.2010)
“Eu trabalhava na roça, plantava feijão, milho, criava vaca, tudo para consumo próprio ou para conseguir algum dinheiro. No verão, eu trabalhava como boia-fria, cortando cana no sul de Alagoas, na usina Camaçari, que fica perto de Penedo.
“Na época, não tinha a menor ideia do que era tênis. Não conhecia. De esporte, eu só sabia o que era futebol. É o que se joga por lá. E eu era bom. Pelo menos era melhor do que sou no tênis hoje.
“Então, em 1991, fui visitar meu irmão que estava morando em Curitiba. Era para eu ficar oito dias, de férias. Mas ele estava trabalhando em uma obra e resolvi ajudá-lo, até para não ficar sem fazer nada lá. Além disso, fui conseguir um dinheiro.
“Fiquei uns cinco dias como servente de pedreiro na obra da academia [de tênis Daniel Contet, no bairro de Santa Felicidade].
“Mas fui ficando, ficando e virei funcionário da academia [que foi vendida para o francês radicado no Brasil Didier Rayon, primeiro treinador de Teliana].
“Virei auxiliar-geral da academia do Didier. Fazia de tudo, cuidava do bar às quadras. E há seis anos sou construtor de quadras. Antes, só reformava e vendia material.
“Depois de um ano e oito meses, fui buscar meus cinco filhos e minha mulher (Maria Nice) em Pernambuco. Nós morávamos em um povoado chamado Barra da Tapera, que fica na divisa com Alagoas. Tanto que meus filhos nasceram em Santana do Ipanema (AL), pois o custo dos partos lá era mais baixo do que em Pernambuco.
“Leila, 32, Renato, 29, Teliana, 26, Júnior, 23, e Valdelice, 21, nasceram lá. Depois, em Curitiba, ainda nasceram a Juliana, 17, e o Renan, 15.
“Hoje [em agosto de 2010] Leila trabalha na parte administrativa da academia, Renato joga tênis e ensina outros a jogar [atualmente é ele o treinador da irmã famosa], Teliana e Júnior são profissionais. E todos descobriram o que era tênis na academia, me vendo trabalhar, desde pequenos.
“A Teliana e o Júnior estão entre os melhores do Brasil hoje, né? Eu tenho muito orgulho deles. Mas não viajo com eles, não, prefiro ficar por aqui, torcendo.
“Eles ficavam até tarde do lado de fora das quadras, vendo. Depois, começaram a ser boleiros. Ganhavam de R$ 3,00 a R$ 4,00 por jogo. Com o tempo, as pessoas que jogavam na academia davam até roupas, tênis, raquetes para eles começarem a jogar. Foi assim que aprenderam.
“Tênis não é esporte de burguês. É um esporte normal. E um dos mais legais. Claro que muitas pessoas carentes não têm acesso ao tênis. Mas, se você for ver, hoje, já tem uns 20% [dos praticantes] que não são ricos.
“Olha o meu caso. Fui trabalhar na construção de quadras, e meus filhos viraram boleiros. Chegavam a ficar pegando bola em 12 jogos por dia. Para a gente, aquele dinheirinho era importante. O que eles ganhavam era metade da nossa renda. E, se pedir para a Teliana, ainda hoje, ela fica de boleira se precisar. O tênis ensina muito, sabe?
“Hoje eles se mantêm com o que ganham no tênis. Têm patrocínios. Mas depende muito dos empresários. Se eles quisessem ajudar os atletas, podiam. E não seria mais esporte de burguês…
“O problema é que praticamente só construo quadra em casa de rico, chácara, condomínio fechado. Tudo particular. Nesses anos, nunca construí uma quadra pública, ou em escola para crianças jogarem tênis. Nos últimos anos, construí umas 20. As [quadras] que reformei nem sei quantas foram. E só em escolas particulares. Uma quadra de saibro sai por R$ 45 mil, com iluminação e tudo. A manutenção mensal, muito boa, uns R$ 350. Então, poderia ser feito pelos governos, não?”