A receita de uma medalha de ouro olímpica: pegue dois pêssegos e um sorvete comum, de palito, pode ser de chocolate mesmo. Antes, deixe separado um convite boliviano. Uns dois anos e meio sem experiência internacional ajuda na maturação. Estar em um piso de palha pode ser importante no processo. Use uma roupa nova, mas emprestada, de preferência por um aluno. No momento de finalizar, é importante temer um alemão, secar um cubano e derrubar um húngaro. Misture tudo com um drama familiar. Pronto!
Se não fosse o próprio Rogério Sampaio, judoca campeão olímpico em Barcelona-1992, a contar a história da sua maior conquista, seria difícil acreditar como o santista que hoje tem 48 anos chegou ao lugar mais alto do pódio naqueles Jogos.
Este momento olímpico está contado aqui, clique e leia.
O tom dramático da conquista começou anos antes da própria classificação olímpica. Era uma época na qual o Brasil ainda conquistava poucas, pouquíssimas medalhas. Basta lembra que em Barcelona-1992, foram apenas três pódios: Rogério, no judô, e a seleção masculina de vôlei, no topo; Gustavo Borges, da natação, com a prata.
Ou seja, o apoio era pouco. Ou nada. Tanto que nem mesmo quimono novo Rogério diz ter conseguido para ir aos Jogos. Para lutar com uma aparência melhor (já bastava ser desconhecido dos rivais), ele emprestou uma vestimenta nova de um aluno. Sim, era preciso dar aulas para conseguir se bancar no esporte de alto rendimento no Brasil.
Se faltava roupa, imagine local de treino. Tatame de palha, enquanto as competições eram nos sintéticos. Viagens, quando dava. Vídeos dos oponentes, quase nunca. E luta mesmo era contra os dirigentes da Confederação Brasileira de Judô. E, por isso, nada de competir pela seleção durante todo o ciclo olímpico. Então, apareceu o convite para defender a Bolívia na Olimpíada. A Bolívia. Encontro em churrascaria famosa em São Paulo. E nada de acerto. “Graças a Deus”, recorda, aliviado o campeão olímpico.
Da luta contra a balança na véspera (dois pêssegos e um sorvete, que Rogério diz ser uma de suas paixões até hoje) à luta contra a própria mente (bronze já estaria bom, não?), nada será maior do que o drama familiar um ano antes.
Ricardo, irmão quatro anos mais velho, mesmo peso, chegou a disputar com Rogério a vaga nos Jogos de Seul-1988… e ganhou. A inspiração, o companheiro de todos os treinos, a saudade. Tirou a própria vida com a faixa preta. A medalha de ouro acabou virando uma homenagem póstuma. Rogério se emociona até hoje ao recordar aqueles dias. O mais feliz e mais triste dos dias.
Se há receita para o ouro? A história de Rogério Sampaio ajuda a dar a resposta.