Ary Graça, 73, em entrevista à Folha, publicada na última quarta-feira (22), falou dos problemas da FIVB (Federação Internacional de Vôlei) com o comitê organizador dos Jogos do Rio, opinou sobre o público na Olimpíada, falou de outros esportes e até das denúncias contra ele.
O presidente da FIVB também tratou de vôlei e das ideias que tem para a modalidade enquanto for presidente –o mandato dele vai até 2024, quando terá 81 anos. Graça cogita a ideia de ter o vôlei na Olimpíada de Inverno e reforça os planos para reduzir o tempo de hoje para o limite de 1h45. Ainda comenta sobre a polêmica com o Irã e os negócios com os japoneses.
Dinheiro
O Comitê Olímpico Internacional repassa milhões de dólares às federações internacionais a cada ciclo olímpico, com base em grupos que redefine normalmente a cada quatro anos. Em 2013, na última divisão, ficaram no Grupo A as federações de desportos aquáticos, atletismo e ginástica. No B, basquete, ciclismo, futebol, tênis e vôlei. A divisão ainda tem entidades no C e no D. O primeiro grupo recebeu US$ 47 milhões, enquanto o segundo, US$ 22 milhões, cada entidade. E Ary Graça colocou como meta elevar o vôlei para o Grupo A antes dos Jogos de Tóquio-2020.
“Nossa meta é estar no Grupo 1, que deu US$ 40 milhões a cada um deles. Eu ganhei US$ 22 milhões. Mas quero os 40. O vôlei não quer ficar parado. Estou vendendo a imagem que sou um esporte da família. O vôlei tem 60% da torcida formada por mulheres. O fato de não ter paixão, como o futebol, é ruim para caramba, se tivesse clubes de camisa seria maravilhoso. Mas em compensação não tem briga”, diz Graça.
TV
Segundo o próprio Graça, o Japão sustenta a FIVB. Ele explica a conta: “A Fuji TV, a TBS e a Nippon TV pagam por evento, por campeonato. São US$ 8 milhões pela Copa do Mundo, por exemplo. O Campeonato Mundial feminino de 2018 será no Japão e pagaram US$ 14 milhões. Com a Globo eu refiz o contrato de 2010, que vai até 2018, e por esse período eles pagaram entre US$ 20 e US$ 30 milhões pelos direitos de transmissão de tudo.”
Mudanças no jogo
A FIVB está fazendo alguns estudos e testes para deixar qualquer partida de vôlei com no máximo 1h45, tempo que consideram ideal para as transmissões de TV. “Há várias possibilidades, uma delas é ter todos os sets com 15 pontos e os times precisarão jogar os cinco sets. Ganha quem tiver mais pontos no final. Basquete é assim. Você sabe que é próprio do ser humano não querer mudar nada. Mas a TV é fundamental para nós”, afirma. No futuro, porém, Graça acredita que vai conseguir ter lucro com as transmissões via Internet também. “Em quatro ou cinco anos vamos tirar dinheiro daí.”
Américas do Norte e Central
“Estamos fazendo um esforço muito grande na América Central. Mais de US$ 10 milhões investidos para desenvolver o vôlei lá. E a direção passada da FIVB não falava com os EUA, porque eles são um país diferente. Hoje estou fazendo acordos, já fiz quatro torneios lá. Estava disposto a fazer investimento e ganhei dinheiro. Não quero tomar mercado, quero 3% do mercado americano e já é mais do que já tenho hoje. Nós estamos resolvendo o problema interno deles, porque o universitário não fala com a quadra, que não fala com a areia. Conclusão, já fizemos negócio com a [rede de TV] NBC”.
Irã
“É um problema enorme aquilo ali. Prenderam a garota [Ghoncheh Ghavami, 25, foi condenada a prisão por tentar assistir a uma partida de vôlei em seu país]. Eu escrevi para o presidente do Irã [Hassan Rohani], ele me respondeu, mandei outra carta. Estive com a mulher do Women Women Rigths e disse: ‘Quem sou eu para chegar para um governo, falar de muçulmanos e dizer que Moisés agora sou eu’?”.
A polêmica ocorreu em 2014, e o presidente da FIVB disse que ainda negocia uma solução.
“Vamos com calma, vamos levando. E o Irã agora está muito bem, vôlei é o esporte número um no Irã. Falei para a mulher: “A senhora está sendo preconceituosa, está se atendo ao problema da mulher nos jogos do masculino, mas o homem também não podem também ver o homem no feminino’. Já fizemos torneio de praia lá e passou. A solução estava bem encaminhada com o governo. Aí vem o aiatolá e diz que não pode, porque o povo protesta. Estava tudo certo, aí vieram os fanáticos e disseram que ia quebrar tudo, jogar bomba. Pedi para recuar, não quero morrendo gente no vôlei. Ele não liga nem para a Europa ou os Estados Unidos, acha que vão abrir mão de algo por causa do vôlei. Nosso sistema é ir com jeitinho. Queremos uma parte do ginásio para as mulheres e outra para os homens. Achei melhor o recuo tático e ano que vem vamos atacar de novo”, explica Graça.
Uniformes das mulheres no vôlei de praia
“Nunca ninguém reclamou para a gente. Ao contrário, acho injusto, em tom de brincadeira, claro, as meninas jogarem de biquíni e os caras jogarem com bermuda longa. Injusto paras mulheres, as feministas deviam criar caso para os caras botarem as pernas de fora. Sem camisa não dá por causa do patrocínio. Tudo é moda, na minha época tinha que jogar de sunga”.
Vôlei nas Olimpíadas de Inverno?
“Você sabia que já tem vôlei no gelo? Já tem. Está em estudo no hemisfério norte. Quadra de gelo, com tênis especial. Para que a gente possa entrar nos Jogos de Inverno. É uma ideia nossa. Dá para fazer tranquilamente. Tem que ter vôlei o ano inteiro para ter contrato com a TV o ano inteiro.
ENTENDA AS DENÚNCIAS DE IRREGULARIDADES QUE ATINGEM ARY GRAÇA
Em março de 2014, denúncias de irregularidades em contratos vieram à tona em reportagens da ESPN Brasil, segundo as quais duas empresas de dois ex-dirigentes da CBV, Marcos Pina e Fabio Azevedo, teriam recebido R$ 10 milhões cada uma em comissões para intermediação de contratos diretamente tratados com patrocinadores.
No mesmo mês, o então presidente Ary Graça, a quem os dois eram ligados, pediu renúncia da presidência e foi sucedido por Walter Pitombo Laranjeiras, o Toroca.
A confederação contratou auditoria externa que confirmou o pagamento de recursos sob suspeita. Em seguida, disse que os contratos (com duração até 2017) seriam suspensos. Graça sempre negou as acusações.
O caso foi investigado pela CGU (Controladoria-Geral da União). O órgão federal emitiu relatório que gerou a suspensão do contrato de patrocínio do Banco do Brasil, que perdurava desde 1991 e pagava anualmente R$ 70 milhões à CBV, segundo a Folha apurou em dezembro de 2014, data da ruptura.
Meses depois, o banco retomou o patrocínio depois de a confederação cumprir uma série de exigências.